Há mais de dez anos que Carlos Rodrigues embarcou nesta viagem para criar música instrumental, cheia de contundências e, ao mesmo tempo, subtil. Em 2014, gravou o álbum "Cosmic Seed" e até já partilhou o palco com vários artistas portugueses e internacionais, como os Kumpania Algazarra, Richie Campbell, Blasted Mechanism, Wild Marmalade ou Iban Nikolai. Mas só o nome Kabeção, alcunha desde os tempos do liceu, já dá para perceber que ali há muito mais história. Foi a pensar nisso que, em nove perguntas, o The Intern abre a porta do universo de Carlos, 27 anos, o instrumentista português que quer atravessar fronteiras e levar a linguagem do handpan para os ouvidos dos quatro cantos do mundo. Um aviso: o resultado é sempre diferente, mas encantador. No fim, vai dar por si a questionar porque é que só agora ouviu algo assim.
1- Como é que surge o encontro com a música?
Eu ouvia muita música na rádio, em festas de família e também assistia a alguns concertos. Depois, a certa altura, comecei a prestar mais atenção aos bateristas, aos percussionistas e à parte rítmica das bandas. Foi nesse momento que despertou uma vontade enorme de eu próprio começar a tocar e, de certo modo, ganhar um autoconhecimento maior sobre mim. O som fez com que eu começasse a olhar mais profundamente para mim próprio e comecei a entender muito da minha personalidade, sobre a relação que tenho com os outros e a forma como sinto o que me rodeia. Desde aí, tornei-me muito mais sociável, ouvinte e atento. Aos oito anos comecei a tocar percussão e aos 16 tornei-me músico de profissão. Hoje, sinto que a música pode funcionar como uma jornada para nos conhecermos melhor e não consigo imaginar a minha vida sem ela.
2- E os momentos de inspiração?
A minha inspiração vem de tudo o que me rodeia. Sejam as pessoas que amo, a natureza ou até cada pequeno momento.
3- Para quem não conhece o Handpan, o que é?
O original chama-se hang e é um instrumento musical da classe idiofônica, onde o som é provocado por vibração. Foi criado, em 2001, por Felix Rohner e Sabina Schärer, em Berna, na Suíça, que são os proprietários da PANArt. Este instrumento é composto por duas peças de metal que estão juntas: o ding e o gu. O primeiro, tem oito tons que, juntos, formam uma escala musical. Já o outro, possui um bass port, inspirado num instrumento de percussão, originário da Índia, que se chama gatam. Cada hang é afinado individualmente e os seus criadores têm à sua disposição várias escalas por onde podem escolher ao seu critério. Vai desde a mais oriental, à arábica, celta ou indiana. A escolha da atmosfera que o instrumento pode gerar é imensa. Depois, existem várias formas para tocar este instrumento. Mas o toque tem de ser sempre suave e delicado, porque se for demasiado forte pode acabar por desafiná-lo. Cada instrumentista tem a sua "voz", o seu toque e a sua essência. Ou seja, de certo modo, é o mesmo instrumento, mas sempre diferente.
4- Quando é que descobriu este instrumento?
Foi em meados de 2007. Eu estava a passear em Lisboa, na Rua Augusta, e ouvi uns sons incríveis vindos não sei de onde. Mais parecia uma harpa ou um piano. Quando me aproximei, dei de caras com um rapaz israelita, o Ortal Pelleg, a tocar um hang feito pela companhia original, a PANart. Fiquei completamente hipnotizado pelo som e não queria sair daquele momento. Quando ele terminou de tocar tivemos uma boa conversa e ainda tive oportunidade de experimentar o instrumento pela primeira vez.
5- Que som é este?
É incrivelmente cristalino, muito profundo e também etéreo. Se for tocado de forma suave, torna-se até bastaste meditativo e zen.
6- Como é que se aprende a tocá-lo?
Ainda não existem muitos professores ou masters destes instrumentos. Algumas pessoas começaram mais cedo que eu e de alguma forma são elas que me inspiram a criar música através do Hang. Eu comecei sozinho a tocar nas ruas, lá para os finais de 2011, e também sozinho desenvolvi a minha própria linguagem. No fundo, sinto que este instrumento é relativamente fácil de tocar. Não se compara a um violino ou a um trompete. É algo muito mais intuitivo, porque tem poucas notas e as que tem pertencem a uma escala específica. O que faz com que tudo soe razoavelmente bem. Basta colocar os dedos a dançar no instrumento.
7- Quais foram os sítios onde se apresentou que mais o marcaram?
Na 5ª edição do festival Hangout, em 2014, nos Estados Unidos da América, no programa "Got Talent Portugal" da RTP, em 2015, na 20ª edição do Boom Festival, em 2016, em Idanha-a-Nova, e no festival Le Rêve de L'Aborigène 2016, em França.
8- Tem algum projeto que gostasse de ver realizado?
Gostava, essencialmente, de poder chegar a mais pessoas com a minha música.
9- E o público, como reage?
O feedback tem sido bastante positivo. O público é extremamente carinhoso, tanto em Portugal como lá fora. Recebo muitos comentário de pessoas que se conetam profundamente à minha música nos concertos que dou, mas também nos vídeos que publico no Youtube. Sinto que tenho tocado imensos corações e isso é o mais importante para mim. Despertar o amor e tocar fundo nas pessoas com a música. É a minha missão.